Advogados tributaristas criticaram a MP (medida provisória) 1.227 de 2024, que trata da compensação tributária da desoneração da folha de salários de empresas e de municípios. A proposta já está em vigor e limita o uso de créditos tributários com o PIS/Cofins (Programa de Integração Social/Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social). Na prática, aumenta indiretamente a carga tributária de empresas.
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A medida provisória veda a possibilidade de ressarcimento do crédito às empresas, previsto em 8 leis que serão revogadas.
Especialistas afirmaram que a medida provisória é inconstitucional por 2 motivos: desrespeito ao período de transição – a Constituição determina que quaisquer mudanças que impliquem em um aumento do custo tributário precisam ser implementadas em um prazo de ao menos 90 dias, a chamada noventena. Segundo os advogados, essa regra vale mesmo para aumento de cobrança; e falta de justificativa para edição de MP – uma medida provisória deveria ser editada só em assuntos considerados urgentes. Os tributaristas afirmam que a compensação da desoneração não pode entrar nesse caso pois a necessidade decorre de uma falta de articulação do governo com o Congresso.
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A entrevista foi fornecida ao Poder360.
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“O governo vai dizer que tem urgência por conta da arrecadação. Mas essa é uma urgência criada pelo próprio governo. O fato de o sistema de reoneração da folha não ter sido conseguido pelas negociações com o Congresso não significa que o governo tem que compensar valores que achava que teria”, disse Julio de Oliveira, professor de tributação de negócios do Insper e sócio do Machado Associados.
Segundo os especialistas, a MP 1.227 de 2024 trará impacto ao caixa financeiro das empresas. Muitas companhias se programaram para usar os créditos tributários do PIS/Cofins para pagar outros impostos. Com a mudança, o gasto efetivo para os outros tributos fica mais oneroso. “A medida provisória impacta consideravelmente as empresas na medida em que prejudica o fluxo de caixa com essa limitação da compensação”, afirmou Sérgio Grama Lima, sócio da área Tributária do escritório Leite, Tosto e Barros Advogados.
Os tributaristas sugerem que, se o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) realmente quer tentar emplacar as mudanças estipuladas na medida provisória, as regras deveriam tramitar no Congresso como PL (projeto de lei). O argumento é que haverá mais tempo para que as empresas acompanhem o tema e se adaptem a uma eventual mudança. Com a medida provisória com validade instantânea, os empresários foram pegos de surpresa.
Se é um processo legislativo, toda a comunidade tem condição de acompanhar e se preparar inclusive após a aprovação das duas Casas [Câmara e Senado] e uma remessa à sanção presidencial. Agora, editar uma MP que muda regra no mesmo dia é acabar com qualquer previsibilidade do empresário brasileiro e prejudicar muito o fluxo de caixa”, disse Bruno Romano, outro sócio do Leite, Tosto e Barros Advogados. O secretário especial da Receita Federal, Robinson Barreirinhas, declarou na terça-feira, que o governo federal não conversou com os setores afetados pela medida, só com deputados e senadores.
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Segundo ele, não foi possível estimar quem foi afetado com a mudança na regra dos créditos do PIS/Cofins. Para os advogados consultados, isso é uma imprecisão do Fisco. Eles defendem que o órgão tem os meios necessários para estimar o que for necessário. “A Receita Federal tem total condições e instrumentos para medir as compensações de PIS/Cofins e de outros tributos com segmentos e com outras empresas. Isso não se justifica”, disse Sérgio Grama.
A medida deve ser alvo de ações na Justiça, uma vez que o estoque de crédito acumulado pelas companhias torna-se ineficaz. O pagador de imposto poderá pedir ações protetivas para resguardar o direito de compensar os créditos já constituídos. Barreirinhas admitiu a possibilidade de ações no Judiciário e disse que já deve haver advogados “vendendo o produto por aí”. Entretanto, minimizou o possível movimento das empresas. O secretário disse não ver argumentos contrários e que o governo está seguro da constitucionalidade da medida. Ele declarou também que a AGU (Advocacia Geral da União) é um órgão de excelência.
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“MP DO FIM DO MUNDO” Um dos setores prejudicados é o de exportação, pois é uma das áreas que mais acumula créditos tributários do PIS/Cofins. Destacam-se as companhias que produzem manufaturados.
O presidente-executivo da AEB (Associação de Comércio Exterior do Brasil), José Augusto de Castro, definiu as ações de compensação do governo como “MP do fim do mundo”. Ele disse que a nova regra será responsável por promover o desemprego no setor. Entretanto, declarou não conseguir estimar o número exato, pois a medida é muito recente.
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“Essa é a ‘MP do fim do mundo’ porque ninguém esperava isso, por mais pessimista que fosse […] Toda empresa hoje tem créditos de PIS/Cofins que ela sempre compensou com os outros impostos federais, afinal o governo é um só”, disse ao Poder360. Castro disse ainda que o governo não dialogou com o setor de exportações sobre a medida provisória. “As empresas vão começar a demitir pessoas e reduzir a produtividade. Reduzindo a produtividade, cai a arrecadação, que é o que o governo quer aumentar”, afirmou….