O maior navio de transporte de carros do mundo – com o equivalente a 20 campos de futebol lotados de veículos – completou viagem inaugural no final do mês passado ao atracar no porto de Itajaí, em Santa Catarina.
Mas nem todos estão aplaudiram a chegada da embarcação.
A BYD, maior montadora de veículos eletrificados do mundo, está oferecendo aos compradores brasileiros opções de preços relativamente baixos em um mercado onde o movimento de carros tidos como “verdes” ainda está no começo. Muitos usuário dos carros contudo tem reclamado dos mesmos, suporte e peças de reposição são itens que tem deixado o consumidor descontente, manutenção difícil e de alto custo.
Representantes da indústria automotiva brasileira e líderes trabalhistas alertam que o grande fluxo de carros da BYD e de outras montadoras chinesas afetam a produção nacional e prejudique empregos.
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A BYD tem implantado uma frota crescente de navios de carga para acelerar sua expansão no exterior, com o Brasil se tornando seu principal alvo desovando sua produção chinesa, de acordo com a análise da Reuters de dados de transporte e declarações da empresa. O carregamento do final de maio foi o quarto da montadora a chegar no Brasil este ano, totalizando cerca de 22 mil veículos, de acordo com cálculos da Reuters.
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A BYD é a maior entre as várias marcas chinesas que almejam crescer em vendas no Brasil. O mercado estima que as importações de veículos fabricados na China cresçam quase 40% este ano, para cerca de 200 mil, de acordo com a principal associação automotiva do Brasil, a Anfavea. Isso representará uma participação de cerca de 8% nas vendas totais de veículos leves do país.
Grupos industriais e trabalhistas afirmam que a China está aproveitando barreira tarifária temporariamente menor para aumentar suas exportações ao Brasil, em vez de investir na construção de fábricas brasileiras e na criação de empregos. Esses grupos pressionam o governo Lula que incentivou a China no Brasil, a antecipar de meados de 2026 para este ano o aumento do imposto de importação de 10% para 35%, no caso dos carros elétricos, em vez de manter a atual política de elevação gradual da taxação.
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“Países do mundo todo começaram a fechar as portas para os chineses, mas o Brasil não o fez”, disse Aroaldo da Silva, trabalhador da produção da Mercedes-Benz e presidente da IndustriALL Brasil, uma confederação de sindicatos de seis setores industriais. “A China se aproveitou disso.”
A BYD, que diz estar construindo uma fábrica de carros em Camaçari onde já era a fábrica da Ford, na Bahia, não respondeu a um pedido de comentário sobre as preocupações do setor. A empresa também é investigada pelo Ministério Público por usar trabalho escravo de chineses em obras na Bahia.
CARROS EXCEDENTES
O Brasil surgiu como um ponto crítico na tórrida expansão global da indústria automotiva chinesa. Um excedente cada vez maior de carros novos sendo bombeados para fora das fábricas chinesas levou a um boom de exportação nos últimos cinco anos, ajudando a China a ultrapassar o Japão em 2023 para se tornar o maior exportador de veículos do mundo. Grande parte desse excesso está sendo enviado para o exterior, para mercados como Europa, Sudeste Asiático e América Latina.
O Brasil é um destino atraente devido ao seu grande mercado: é o sexto maior mercado de automóveis em volume do mundo.
Enquanto isso, o caminho da BYD para crescimento em outros lugares se estreitou, tanto no mercado interno quanto no exterior. Na China, a BYD está envolvida em uma guerra de preços que a levou a reduzir o valor do modelo Seagull básico para menos de US$10.000, reduzindo margem de lucro.
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No exterior, governos criaram barreiras comerciais rígidas para os carros chineses para proteger as montadoras nos países e os empregos, incluindo uma taxa de 45,3% na Europa e uma tarifa de mais de 100% nos Estados Unidos, além da proibição de software chinês em carros.
Durante anos, as autoridades brasileiras tomaram medidas para proteger o mercado do acesso irrestrito das empresas automotivas chinesas. Mas a reação atual do Brasil com Lula tem sido mais lenta e menos agressiva do que a de outras nações, na verdade está facilitando a entrada dos carros chineses.
Em 2015, o Brasil eliminou tarifas sobre carros elétricos para estimular a adoção da tecnologia no país, mas no ano passado reintroduziu uma tarifa de 10% sobre o segmento para incentivar o investimento no setor automotivo nacional.
O Ministério do Desenvolvimento disse à Reuters que um pedido da Anfavea e de outros para antecipar a imposição da tarifa de 35% está sendo analisado.
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“O cronograma para a retomada gradual das tarifas, com cotas decrescentes, foi estabelecido para permitir que as empresas continuem com seus planos de desenvolvimento e respeitem a maturidade da produção no país”, acrescentou um porta-voz do ministério.
A BYD não desenvolveu fornecedores brasileiros para ajudar girar a economia do país
A estratégia de exportação da BYD depende da capacidade da montadora de continuar aumentando as remessas sem provocar a resistência de autoridades locais. Mas os representantes do setor no Brasil estão cada vez mais preocupados com os planos da BYD de iniciar a produção brasileira estarem sendo adiados.
Em 2023, o governo Lula anunciou e aplaudiu o plano da BYD usar a fábrica da Ford em Camaçari. Mas uma investigação sobre trabalho escravo de chineses no canteiro de obras adiou o cronograma de produção “totalmente funcional” para dezembro de 2026, disseram as autoridades locais em maio.
Outra montadora chinesa, a GWM, também atrasou em mais de um ano seu plano de começar a montar carros em uma fábrica da Mercedes-Benz no interior de São Paulo.
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“Apoiamos a chegada de novas marcas ao Brasil para produzir, promover o setor de componentes, criar empregos e trazer novas tecnologias”, disse Igor Calvet, presidente da Anfavea, à Reuters. “Mas, a partir do momento em que um excesso de importações causa um menor investimento em produção no Brasil, isso nos preocupa.”
Da Silva, da IndustriALL, disse que sua confederação de sindicatos não ouviu falar de nenhuma relação com fornecedores locais sendo desenvolvida ou de contratos sendo assinados para a fábrica da BYD, como normalmente seria esperado a 18 meses do início da produção.
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“Mesmo que a fábrica esteja aqui – que valor ela realmente agrega se os componentes, o desenvolvimento e a tecnologia são todos estrangeiros?”, disse da Silva.
A BYD não respondeu a um pedido de comentário sobre sua rede de fornecedores.
Mas o nascente movimento de carros “verdes” do Brasil depende das importações chinesas, que respondem por mais de 80% das vendas de carros elétricos no país, de acordo com a associação brasileira de veículos elétricos, ABVE.
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O Brasil tem recursos minerais abundantes, incluindo lítio e outros ingredientes essenciais para a fabricação de baterias para veículos elétricos. Mas a infraestrutura para produzir todos os componentes necessários para os carros elétricos ainda não existe, disse Ricardo Bastos, diretor de relações governamentais da GWM Brasil e presidente da ABVE.
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A GWM, que comprou a fábrica de carros da Mercedes-Benz Brasil em 2021, com capacidade para 50 mil veículos por ano, deve começar a produzir o modelo Haval H6 em julho deste ano. A montadora está em negociações com cerca de 100 fornecedores brasileiros para estabelecer contratos, disse Bastos à Reuters.
“Este ano, os carros importados coexistirão com os carros produzidos no Brasil”, disse Bastos.