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Sob pressão do mercado financeiro e enfrentando disputas internas do governo Lula, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, atravessa o período mais crítico à frente da pasta. O pacote de corte de gastos, aguardado para conter o déficit público e fortalecer a credibilidade fiscal, foi considerado “tímido e insuficiente”.

Os R$ 70 bilhões de economia, previstos para os próximos dois anos, não foram vistos como capazes de alterar a trajetória de alta da dívida pública, que subiu 7 pontos percentuais desde o início da atual gestão e chegou a 78,6% do Produto Interno Bruto (PIB) em outubro.

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Paralelamente, a estratégia de anunciar as medidas de ajuste juntamente com propostas de isenção de Imposto de Renda aumentou a desconfiança do mercado financeiro sobre a convicção do governo da necessidade do equilíbrio das contas públicas.

Além disso, o pacote enfrenta fortes resistências no Congresso, fruto do imbróglio político que mistura a preocupação dos deputados com popularidade e interesses nas emendas parlamentares, emperradas por uma determinação do ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF).

Em uma votação apertada na Câmara dos Deputados, o governo conseguiu, por apenas três votos, aprovar a tramitação em regime de urgência, na quinta-feira (5). A proposta de emenda à Constituição e os dois projetos que compõem o pacote, enviados pela Fazenda ao Legislativo, precisam ser aprovados antes do início do recesso parlamentar, em 20 de dezembro.

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Frentes parlamentares repudiam pacote de ajuste fiscal do governo Lula
“Acho que o Haddad se encontra mais fragilizado, talvez seja um momento em que ele esteja mais frágil desde que ele assumiu como Ministro da Fazenda”, diz Eduardo Grin, cientista político da Fundação Getúlio Vargas (FGV-EESP). “Ele acabou tendo que passar recibo para o mercado de ajuste fiscal que ele não tem como fazer.”

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E acrescenta: “E ao mesmo tempo, ele não consegue levar adiante algumas das suas principais agendas, que é, por exemplo, a reforma tributária. Se no final do ano passado, o ministro apareceu para o mercado financeiro como alguém promissor, que estava encaminhando a reforma fiscal, ele termina 2024 no sentido completamente oposto.”

Embate interno fragiliza ministro
Para Cristian Pelizza, economista-chefe da Nippur Finance, a tarefa do ministro é controversa. “Ele está realmente num dos piores empregos do mundo”, diz. “Precisa tentar um ajuste fiscal trabalhando num governo em que isso não é a pauta principal. Ao mesmo tempo, tem de amenizar a desconfiança do mercado.”

Ele acredita que Haddad “tem tentado” fazer o movimento para o ajuste fiscal, mas esbarra, principalmente, em “elementos mais ideológicos” dentro do governo. “A ala ideológica do Planalto tem uma visão de que o ajuste fiscal é uma imposição da ‘Faria Lima’ [reduto financeiro], o que não é verdade”, diz. “O ajuste é uma necessidade. Não é uma imposição de banqueiro.”

Essa mesma ala, segundo ele, foi a responsável pela ideia de anunciar o corte de gastos junto com os ajustes tributários, isentando os que ganham até R$ 5 mil. “Foi um tiro no pé”, afirma.

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O embate interno com quadros do PT também é destacado por Grin. “[A posição do ministro] é politicamente muito ingrata”, afirma. “Haddad enfrenta a resistência dentro do PT, sobretudo da banda dirigida pela Gleisi Hoffmann, que é presidente do partido. Ela tem muito poder e prestígio junto ao Lula, ela tem um controle da máquina partidária. Apanha também muito dentro do governo, como de Rui Costa [ministro da Casa Civil], por disputa de poder.”

Haddad é o “rosto” do pacote
O cientista político destaca que o presidente Lula, por sua vez, tem como estratégia incentivar o confronto entre os integrantes do governo. “Lula sempre governou alimentando divergência entre os seus principais ministros para que ele pudesse ser o grande árbitro das decisões”, avalia.

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“Com isso, ele ganha o crédito público por ‘ter sido aquele que tomou a decisão’. Foi assim no primeiro governo, entre Dilma [Rousseff] e [Antônio] Palocci e no segundo, entre Dilma e [Guido] Mantega.”

Ao mesmo tempo, segundo Grin, ao anunciar o pacote em rede nacional, Haddad se tornou o “rosto” do ajuste, que pode naufragar. Haddad afirmou, na ocasião, que seu pronunciamento, o primeiro à frente da Fazenda, foi um pedido “pessoal” do presidente.

“Com isso, Lula quis se preservar, como candidatíssimo à reeleição”, constata Grin. “A ‘batata quente’ está nas mãos de Haddad, ele é o ministro da Fazenda.”

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Ruim com Haddad, pior sem ele
Apesar da fragilidade do ministro, da repercussão negativa do pacote e do descrédito do mercado financeiro da política econômica do governo Lula, uma avaliação recorrente entre analistas é de que o establishment não pretende “largar a mão” de Fernando Haddad. Uma pesquisa da Quaest apontou que 90% do mercado financeiro desaprova a política econômica do governo Lula, mas 41% avaliam positivamente o trabalho do ministro.

“Isso demonstra uma divisão”, diz Carlos Braga Monteiro, CEO do Grupo Studio. “Enquanto há insatisfação generalizada com a condução econômica, Haddad ainda mantém algum respaldo individual”, diz. “Ele tem tentado equilibrar demandas políticas e econômicas.”

Segundo o executivo, existe certa condescendência nas críticas a Haddad, visto como uma figura estabilizadora em um contexto político “desafiador”. “Ainda que haja insatisfação com sua gestão, o mercado teme que sua saída possa resultar em um cenário mais instável ou populista”, afirma Braga Monteiro. “O setor financeiro enxerga em Haddad um ponto de equilíbrio, mesmo em meio à pressão política. Em suma, enquanto suas políticas enfrentam críticas, sua presença é considerada menos arriscada do que as possíveis alternativas.”

Para Grin, embora o ministro sofra críticas pela falta de convicção sobre o ajuste, o voto de confiança ainda deve permanecer.

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“Evidentemente que o Haddad não é um fiscalista. Mas também ele está longe de ser um desenvolvimentista”, afirma. “Diria que está mais próximo da visão que a Simone Tebet [ministra do Planejamento] tem, de seriedade com com os recursos públicos. Ele tem noção de como a economia funciona e que dinheiro público não pode gerar gasto sem efeitos na taxa de juro na na inflação, o que gera retorno pior a população que ele quer atender.”

Preocupação é expansionismo e populismo fiscal
Em compasso de espera pela aprovação das medidas, o mercado vem precificando a imprevisibilidade das contas públicas. A cotação do dólar, que rompeu a barreira dos R$ 6 após o anúncio, estabilizou em alta e também deve pressionar a inflação.

A principal preocupação é a sustentabilidade das medidas no longo prazo. O expansionismo fiscal do governo tem provocado o aquecimento artificial da economia, o que tem se refletido na inflação, que deve fechar o ano acima da meta dos 4,5%.

Com isso, os juros futuros permanecem na casa dos 7% reais (descontada a inflação) e a previsão de uma alta de 0,75% da taxa Selic, hoje em 11,25%, na reunião do Banco Central da próxima semana. A previsão é que atinja os 14% em 2025.

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O ex-diretor do Banco Central Alexandre Schwartsman avalia que o governo Lula não tem a intenção de promover um ajuste fiscal, abrindo um cenário de endividamento crescente, aumento dos juros e alta da inflação. “O meu comentário sobre o pacote é que não fizeram mais porque têm receio de derrota eleitoral. Entre a derrota eleitoral e o populismo, eles escolheram o populismo. E vão colher uma derrota eleitoral”, afirmou em entrevista ao Estadão.

Para Braga Monteiro, o “populismo fiscal” do governo está refletido “no atual contexto de alta do dólar e inflação persistente”. “Se as medidas anunciadas não forem acompanhadas por uma execução rigorosa de controle fiscal, o país poderá enfrentar desafios estruturais graves, como aumento da dívida pública e perda de credibilidade no mercado”, afirma. “Isso pode, de fato, ter impacto nas eleições futuras, pela redução da popularidade do governo.”

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