Para a Novanor (a antiga Odebrecht) Aurélio Valporto, 61, é um “litigante profissional” em busca de “vantagem profissional” astronômica. O economista investiu R$ 5.500 em 2018 em um lote de ações da Braskem (BRKM5). Iniciou seis meses depois uma ação judicial em que pode receber, caso vença, R$ 400 milhões.
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Também presidente da Abradin (Associação Brasileira de Investidores), ele considera que as acusações da construtora sinalizam falta de argumentos. O prêmio financeiro está contemplado na Lei das S/A para que o acionista minoritário “vigie, denuncie os abusos e corra os riscos desse tipo de ação”, diz.
Valporto pede, em nome da Braskem, indenização de R$ 8 bilhões a ser paga pela Novonor, antiga Odebrescht. Como autor do processo, teria direito a 5% do valor da causa. Em sua defesa, a construtora alega que o minoritário está atrás apenas da recompensa financeira. Segundo a legislação, os honorários de sucumbência dos advogados seriam de 20%. Neste caso, R$ 1,6 bilhão.
A reação do investidor, que já litigou contra Eike Batista e protocolou ação contra a joint venture entre Embraer e Boeing, é simples: sim, ele pode receber o prêmio. E daí? Afirma que Braskem e Novonor são réus confessos com executivos condenados criminalmente e usam a tática de atacar a honra do adversário.
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“Isso [o dinheiro] não vem ao caso. Esta é mais uma alegação espúria que demonstra falta de argumentos e desprezo pelos acionistas minoritários. O intuito da lei é exatamente estimular os acionistas minoritários, através do prêmio, a fiscalizar, denunciar e entrar com ações como essa para coibir e penalizar controladores inescrupulosos. Estão querendo desvirtuar esse dispositivo legal. Um morador de rua com uma única ação da empresa teria a mesma legitimidade para propor a ação”, afirma.
Quando escuta que a Novonor o acusa de ter buscado o fundo de investimento Prisma Capital para arcar com as custas do processo, ele dá de ombros da mesma forma.
“Sim, busquei quem ajudasse a pagar as despesas e para dividir o eventual prêmio com eles. Financiamento de litígios é uma prática muito comum em países desenvolvidos e é um dos principais motivos desses países terem um mercado de capitais desenvolvido, fomentando a atividade econômica”, completa.
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Ele entrou na Justiça alegando que a Novonor, controladora da Braskem (50,1% das ações), usou seu poder para causar prejuízos à petroquímica em três situações. Uma delas seria a retirada de R$ 513 milhões do caixa para oferecer propinas a autoridades da Petrobras, o que foi registrado no acordo de leniência da construtora na Operação Lava Jato.
Teria existido também pagamento de bônus de R$ 10 milhões (cerca de R$ 60 milhões, com correção) a donos dos seus ADRs (recibos de ações emitidas em outros países e comprados por investidores nos Estados Unidos). Houve R$ 3,1 bilhões em sanções que teriam sido assumidas apenas pela Braskem.
Depois do início da ação, o fundo Geração Futuro L.Par, do investidor Lírio Parisotto, também acionista minoritário na Braskem, se juntou à causa.
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Em primeira instância, o TJ-SP (Tribunal de Justiça de São Paulo) deu ganho de causa a Valporto. Na última terça-feira (10), a 2ª Câmara de Direito Empresarial do TJ reverteu a decisão por 4 votos a 1.
Ele vai recorrer. Não sabe ainda se por meio de embargos de declaração no próprio tribunal paulista ou diretamente no STJ (Superior Tribunal de Justiça).
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“Não houve surpresa alguma [na nova decisão]. Sabemos onde estamos pisando. Os votos predominantes foram absolutamente espúrios. Ao contrário da bem fundamentada decisão de primeira instância, tivemos agora uma decisão kafkiana. O voto da maioria reconhece o ilícito, contudo alega que o desvio de dinheiro do seu caixa rendeu frutos positivos para a Braskem, que teria sido beneficiada por atos de corrupção com o dinheiro desviado. E alegam isso sem mesmo uma perícia para quantificar esses fantasiosos ganhos”, analisa.
Ele considera esse entendimento “imoral”. “Na minha opinião, seria mais digno dizer que não houve ilícito, apesar de confessado”, reclama.
Após o primeiro julgamento, a Braskem entrou com pedido no TJ-SP para não receber a indenização da Novonor. Alegou que isso a colocaria em risco porque poderia anular o acordo de leniência assinado com a Justiça dos Estados Unidos.
É importante lembrar que o governo Lula é um dos controladores da Braskem e tem interesse em preservar a Novonor.
“Essa alegação é simplesmente uma mentira. Anexamos parecer de ex-membro do DOJ [Departamento de Justiça americano] demonstrando a falsidade desse argumento. Quanto aos diretores da própria Braskem, os denunciei recentemente à CVM [Comissão de Valores Mobiliários]. Aparentemente são títeres dos controladores faltando com dever de fidúcia para com a empresa e demais acionistas, penso que devem ser condenados nos termos da lei 6.404″, ataca, citando a Lei das S/A.
Segundo advogado da Novanor, no julgamento da última terça-feira, um dos desembargadores considerou que a ação não tinha como razão de ser o futuro da Braskem. Era uma insinuação de que se trataria do interesse pessoal do investidor.
Valporto crê que isso é desvirtuar a discussão. Ele se vê no papel de quem briga pelos direitos dos acionistas minoritários e o que está em jogo é mais do uma briga com a Novonor. O cerne da questão seria o mercado de capitais no país.
“É muito mais que o futuro da Braskem, é o futuro do mercado de capitais brasileiro e da economia nacional. Me parece um tribunal bastante despreparado para esse julgamento. Não conseguem enxergar a seriedade do que está sendo tratado”, afirma, se referindo à Câmara do TJ-SP que julga disputas acionárias e empresariais.
“É óbvio que estão [sendo desrespeitados os direitos dos minoritários]. Os controladores saquearam os cofres da empresa, roubando, por conseguinte, os acionistas minoritários. Isso foi confessado e muito bem explicado na decisão de primeira instância”, completa, considerando ser uma questão de “moralidade, fato que falta ao mercado de capitais brasileiro”.