O mercado brasileiro denominou de “Super Quarta” quando o anúncio da decisão da taxa de juros do Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc, na sigla em inglês) nos EUA e do Comitê da Política Monetária (Copom) no Brasil ocorre no mesmo dia às quartas-feiras. A semana entre os dias 15 e 22 de setembro será, além da Super Quarta, a Super Semana com a decisão de taxa de juros de cinco Bancos Centrais: dos EUA, do Brasil, do Japão, da China e do Reino Unido.
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Cada Banco Central tem suas dores e dilemas para os próximos passos da sua política monetária. Enquanto o Fomc deve iniciar o ciclo de corte de juros nos EUA e o Banco Popular da China (Pboc, em inglês), o Banco do Japão (BoJ) e o Banco da Inglaterra (BoE) devem mantê-las, o Copom deve elevar a taxa básica Selic no Brasil.
Brasil
Embora muitos economistas vejam como exagerada uma alta na taxa Selic em meio ao início de flexibilização monetária nos EUA e em outras economias avançadas, o mercado trabalha com fatores internos que corroboram o início de um aperto monetário no Brasil. A combinação de uma atividade econômica e uma inflação de serviços acima do projetado, com uma expectativa de inflação acima do centro da meta de 3% em meio a um dólar com alta acumulada de quase 15% em 2024, negociado na casa de R$ 5,55 e R$ 5,65, está no balanço de riscos do Copom e foram confirmados com os indicadores divulgados desde a última reunião do colegiado em julho, entre os quais o PIB do segundo trimestre com alta de 1,4%, mesmo sob uma deflação em agosto.
Outros dois fatores estão pesando para uma alta da Selic. O primeiro são os efeitos da política fiscal sobre a precificação dos ativos financeiros no mercado.
O colegiado avalia, segundo a última ata e comunicado, que o desequilíbrio fiscal com aumento do endividamento público está impactando no preço dos ativos com aumento dos prêmios de risco, o que prejudica a política monetária e exige uma política monetária mais restritiva para que a taxa básica não fique atrás da curva de juros futura.
As últimas declarações do governo federal de aumentar a isenção do piso de rendimento no pagamento do imposto de renda, a continuação na busca de aumentos de impostos e o financiamento de um programa social (o Auxílio-Gás) fora do orçamento público aumentam a incerteza do mercado em relação à trajetória da dívida. A ausência de medidas concretas e estruturais de contenção de gastos para estancar a alta do endividamento intensifica essa desconfiança.
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No curto prazo, o próximo round na questão fiscal é o Relatório Bimestral de Receitas e Despesas do Ministério do Planejamento, que deve ser divulgado na semana que vem, até o dia 22.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já indicou que haverá revisão no planejamento de receita com a frustração das receitas não-realizadas por meio do Carf, com grande possibilidade de novo contingenciamento e bloqueio de despesas.
Confira abaixo os principais eventos econômicos entre os dias 15 e 20 de setembro:
Domingo (15 de setembro): Investimento Estrangeiro Direto de agosto da China.
Segunda-feira (16 de setembro): Feriado na China e no Japão; Balança comercial de julho da Zona do Euro; Boletim Focus.
Terça-feira (17 de setembro): Feriado na China; IGP-10 de setembro; vendas no varejo e produção industrial de agosto nos EUA; balança comercial de agosto do Japão.
Quarta-feira (18 de setembro): Inflação ao consumidor de agosto do Reino Unido e da Zona do Euro; Taxas de Juros e Projeções Econômicas (Dot-Plot) do Fomc; Taxa de Juros Selic do Copom.
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Quinta-feira (19 de setembro): Taxa de juros do BoE e do Banco Popular da China; inflação ao consumidor nacional de agosto do Japão.
Sexta-feira (20 de setembro): Taxa de juros do BoJ; vendas no varejo de agosto do Reino Unido; Receita Tributária Federal de agosto do Brasil; discurso de Christine Lagarde, do Banco Central Europeu (BCE); discurso de Harker, membro do Fomc.
Outro fator que pesa para a alta da Selic é a credibilidade da autoridade monetária no momento de transição do comando da instituição, especialmente no momento de transição da presidência da autoridade monetária.
O nome indicado pelo Palácio do Planalto para substituir Roberto Campos Neto a partir do ano que vem, Gabriel Galípolo, está com um discurso considerado duro para mostrar, segundo alguns economistas, a sua autonomia em relação ao Planalto – crítico feroz da atual gestão monetária -, o que acabou contratando essa alta, mesmo com Campos Neto suavizando o tom de aperto de Galípolo.
Nesse contexto, o Copom inicia na quarta-feira o ciclo de aperto monetário, com uma primeira alta de 25 pontos-base, de 10,5% para 10,75%. Os investidores ficarão atentos ao comunicado para projetar o tamanho do endurecimento monetário, com um fim de ciclo estimado com uma taxa terminal entre 11,25% e 12% – mais provável entre 11,75% e 12%.
EUA
O foco do mandato de política monetária do Fomc é agora o mercado de trabalho. A dúvida é se haverá cortes de 25 pontos-base ou meio ponto percentual na quarta-feira. O mercado se mostra dividido, com leve vantagem para as projeções de um corte modesto de 0,25 ponto porcentual.
É provável que o conservadorismo prevaleça nos membros do Fomc, porque os dados de inflação divulgados nesta semana mostraram uma leve elevação acima do projetado nos núcleos, que excluem itens voláteis como preço de alimentos e de energia. Dessa forma, a narrativa de pouso suave continua preponderante, e os dados de vendas no varejo e de produção industrial um dia antes da decisão de juros devem determinar o tamanho dos cortes. Números abaixo do esperado no varejo e na indústria vão elevar as apostas de corte de meio ponto, enquanto em linha ou acima do esperado devem levar a uma queda de 25 pontos-base nas taxas Fed Funds.
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Depois da decisão de quarta-feira, o mercado vai monitorar o tamanho dos cortes ainda em 2024, se o Fomc vai optar pelo conservadorismo de outros cortes de 25 pontos-base em novembro e dezembro, ou acelera para meio ponto percentual nas próximas duas reuniões ou faz um corte de 50 pontos-base e retoma para uma baixa de 0,25 ponto percentual. Por isso, a divulgação das projeções econômicas dos membros do Fed de PIB, inflação, mercado de trabalho e taxa de juros para 2024, 2025 e 2026 acabam ganhando um protagonismo semelhante à decisão de juros e devem indicar o tamanho dos cortes até o fim do ano e no fim deste ciclo de flexibilização.
Japão
O Banco do Japão voltou ao protagonismo do mercado financeiro este ano, quando elevou a taxa de juros de surpresa de 0% para 0,25% na reunião do fim de julho. Foi um dos catalisadores da “segunda-feira sangrenta” de 5 de agosto, quando os investidores globais se refugiaram em ativos de proteção em meio à aversão ao risco. Junto com receios exagerados de recessão nos EUA naquele momento, a alta de taxa de juros pelo BoJ encareceu, junto com uma valorização do iene ante o dólar como consequência da alta de juros, as operações de carry trade, que consistiam em tomada de empréstimo barato no Japão para aplicação em ativos de risco em outros locais, como a moeda brasileira ou ações nos EUA.
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A sinalização de autoridades do BoJ de que a volatilidade do mercado seria levada em consideração para os próximos passos do aperto monetário, que seria gradual, ajudou a tranquilizar o mercado no mês passado. O discurso reiterando a necessidade de alta de juros com a inflação se encaminhando à meta de 2% ao ano em meio ao crescimento dos salários, porém de forma gradual, vai ter efeito menos traumático do que com o que ocorreu no fim de julho e início de agosto.
O BoJ deve manter, com isso, a taxa de juros em 0,25% na reunião da madrugada de quinta para sexta-feira. Mas, é consenso no mercado que mais uma alta de 25 pontos-base deve ocorrer ainda em 2024, provavelmente em dezembro, após período de troca de líder do partido governista em meio à possibilidade de eleições gerais.
O Banco Central japonês vai ter parcimônia para novos movimentos para não estressar os mercados financeiros nem ser acusado de atuar politicamente. Porém, é provável que este ciclo de aperto eleve a taxa básica de juros a 1%, igual à taxa neutra apontada por um membro do BoJ nesta semana.